Tecnologias digitais na educação

Pierre Lévy (2010) nos lembra que a tecnologia não é boa, nem má, nem tampouco neutra, oferecendo diferentes possibilidades de utilização, e que cabe a nós decidirmos o que fazer com ela. Marta Gabriel compartilha dessa ideia, afirmando que “toda nova tecnologia é tanto uma benção como um fardo”(2013, p. 12), e que temos a função de explorar tanto suas possibilidades como seus limites. Portanto, as tecnologias digitais, dependendo do uso que fizermos delas, podem tanto auxiliar quanto atrapalhar os processos educacionais. Como professores, devemos analisar o potencial de cada tecnologia para auxiliar o processo de ensino-aprendizagem, e proporcionar a aprendizagem significativa, fazendo uso tanto de tecnologias digitais quanto tecnologias analógicas.

Koehler e Mishra (2008) também discutem o complexo papel das TDIC na educação, uma vez que muitas dessas tecnologias não foram criadas para fins pedagógicos, cabendo aos professores a missão de pensar maneiras criativas de integrá-las aos processos educacionais. Nesse sentido, os autores utilizam os conceitos de possibilidades (affordances), limitações (constraints), e fixidez funcional (functional fixedness) que uma determinada tecnologia pode incorporar ou que podemos impor a elas, e alegam que “o uso criativo da tecnologia requer ir além dessa ‘fixidez funcional’,  ressignificando as tecnologias existentes para fins pedagógicos de maneira inovadora” (2008, p. 6). Isso acarreta um grande desafio para professores, pois ao decidir utilizar uma determinada tecnologia é preciso pensar todas as possibilidades em termos de ensino do conteúdo e engajamento dos alunos e também as limitações que cada recurso pode oferecer para efetiva integração nos processos educacionais.

Os autores comparam ainda tecnologias digitais às analógicas, apresentando três características daquelas que podem dificultar a sua integração ao processo educacional. Segundo os autores, tecnologias analógicas como o quadro negro, o livro, o microscópio ou o lápis possuem especificidade, desempenhando uma função específica; estabilidade, pois não mudaram significativamente ao longo do tempo, e são transparentes, ou seja, ao longo do tempo estas tecnologias adquiriram transparência de percepção, fazendo com que não as percebamos mais como tecnologias. As tecnologias digitais, por outro lado, são multiformes (protean) por natureza, tendo diferentes significados para cada pessoa e possibilitando diferentes utilizações. São também instáveis, pois mudam constantemente conforme os avanços tecnológicos, gerando uma grande dificuldade em acompanhar sua evolução e transformações. Por fim, são opacas, pois muitas vezes, cabe ao usuário decidir o uso que fará daquela tecnologia, tendo que adaptá-la para seu contexto de utilização.

Diferença entre tecnologias digitais e tecnologias analógicas segundo Koehler & Mishra (2008)

Ao pensar a integração das tecnologias digitais aos processos educacionais, precisamos ir além da mera utilização instrumental ou ocasional de alguns recursos como softwares de apresentação e projetores multimídia, em processos unidirecionais de transmissão de conteúdos ou mesmo a utilização de SGAs como repositório de materiais e conteúdos digitais. Nesse sentido, parto do conceito de integração pedagógica das tecnologias digitais na educação como a incorporação e utilização frequente e crítica dessas tecnologias nos processos de ensino-aprendizagem de forma que sejam parte integrante e indissociável do processo educacional, reconhecendo os benefícios e limitações que a utilização de cada recurso pode oferecer ao processo educacional, de forma a permitir a transformação de processos de ensino e a melhoria da aprendizagem.

Por fim, Kellner (2000) afirma que a revolução tecnológica nos força a repensar e reconstruir a educação, defendendo a utilização de pedagogias críticas que questionem e ressignifiquem todos os aspectos do processo educacional, do papel do professor às relações entre professor e alunos, a instrução em sala de aula, sistemas de avaliação, o valor e limitações de materiais de ensino como livros e multimídia, e os próprios objetivos da educação. No entanto, o autor destaca a necessidade de se manter o olhar crítico perante o grande entusiasmo e euforia em relação às tecnologias digitais na educação, refletindo sobre a natureza e efeitos dessas tecnologias e das pedagogias desenvolvidas em resposta aos seus desafios, afirmando que

Mas em vez de seguir tal lógica moderna de “um ou outro”, precisamos buscar a lógica do “este e aquele”, buscando o design e a crítica, a desconstrução e a reconstrução, como complementares e suplementares e não como escolhas antagônicas. Precisamos certamente desenvolver novas tecnologias, pedagogias, e currículos para o futuro, e devemos tentar desenvolver novas relações pedagógicas e sociais, mas também precisamos criticar o mau uso, o uso inapropriado, alegações infladas, exclusões e opressões envolvidas na introdução das novas tecnologias na educação (KELLNER, 2000, p. 258, tradução nossa).

Ou seja, não se trata de substituir uma tecnologia por outra ou abandonar as tecnologias analógicas em detrimento das digitais, mas fazer uso de novas e antigas tecnologias, de forma complementar, analisando suas potencialidades e limitações para o processo de ensino-aprendizagem a fim de expandir as possibilidades educacionais e transformar a prática pedagógica.

Referências:

Nota: Este artigo foi adaptado de uma seção de minha tese de doutorado. Se quiser ler o trabalho completo, acesse aqui.

Tecnologias digitais na educação

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